quarta-feira, 10 de abril de 2013

Hoje à noite, não há luar.

Eu nem quero sentir saudade, nem quero sentir dor. Nem quero sentir falta, nem ausência. Nem o estendal sem sentido, nem a panela que coze o que só há. Não quero o coração confuso, nem a alma inquieta. Nem quero sentir que podia pedir, nem quero sentir que fui ignorada, Não quero sentir que fui convidada, nem quero sentir que não fui. Não quero saber de sofrer, não quero saber de repensar. Não quero ser quem não foi. Quem não existiu, quem se excluiu, quem se desfez. Não quero ser o coração amargo que rejeita, que conhece e afasta. Que se protege para não doer. Não quero ser o final, a verdade ou a mentira. O retalho, a saudade ou o pedaço. Não quero ser o único amor, não quero ser quem não foi. Não querto ser a falta, a possibilidade.

Quero ser quem está. Junto, ao lado, partilhadora. Quero ter pela vida aquilo que escolhi, aquilo que me conforta. Quero as pontes e as luzes. Quero a Ribeira, quero a calma, quero a paz que me pode dar. Quero sair e voltar. Quero ter o que pedi, o que escolhi. Quero continuar na caminhada a que dei início. Quero não ser interrompida. Quero que seja, quero que continue a existir. Quero o luar de Primavera, quero o pôr-do-sol de verão. Quero a chuva de Outono e o gelo de inverno. Quero todas as estações. Quero separar a roupa, quero lavar, quero passar, quero guardar. Quero a vista, quero a minha casa, quero o lar. Quero que respeitem o que me prometeram, um dia, e não há muito. A mim e a quem veio do meu ventre.

É nestes dias, em que quero demais, e em que tudo me faz falta, e  em que tudo se contexta, que a música, contraditoriamente acalma o meu coração. Acalma a saudade que eu aprendi a sentir e a guardar para mim. Que eu entendi ser parte de mim. É nestes dias que eu entendo que isto é a minha vida, e que quero que assim continue. Estranhamente, ou covardemente.  E é nestes dias em que repenso tudo isto...e penso na fuga, no outro lugar. Nas promessas que existem, naquilo que posso ser e dar para quem de mim depender.

A felicidade que sonho não existe sem este pensar. Sem este pensar. Sem este pensar. Sem esta contradição de querer estar e de querer fugir. O coração não se completa sem a amargura da realidade e sem a dor da falta. Muito menos sem o sonho. O sonho do que há, do que pode haver, do que pode estar guardado.  Há noites, e há dias em que faz falta o completo do que somos, e em que faz falta o sonhar. O que somos, nada mais é do que aquilo que vivemos. E então pensamos, que há tanto que vivemos num mesmo, que é difícil mudar, embora se faça necessário. E mais uma vez, a música acalma a saudade, e acalma o pensar.  Acalma o coração que se ressente do som daquilo, daquele lugar. Que quer, e que rejeita. E depois, há o sonho de não poder lá estar, porque não quero, e ao mesmo tempo desejo. Anseio e tenho medo. Então, acordo aflita pela dor da ausência daquela materialiddae amiga e solar. E penso na culpa de lá estar, e não aqui. E na culpa de aqui estar.

E hoje à noite, não há luar. Porque estou sem saber o que procurar, ou onde. E aí eu penso estar a me construir. E só quero saber onde. Onde...onde.

Um comentário:

  1. Um deslumbramento de palavras-quereres poeticamente bordados!
    Toca, afeta, convida...
    Quem escreve descortina mundos, inclusive o próprio. Bela ousadia!
    Beijos,
    Dayse Luna.

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